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No final da minha graduação, na matéria de Psicologia da Educação, fiz um trabalho sobre o documentário Meninas: gravidez na adolescência. Eu já me entendia feminista e, após ver esse documentário, entendi mais ainda sobre a sociedade na qual estou inserida, sobre as pessoas que me cercavam e a visão de destino que se tinha — ainda se tem — para as mulheres.
Em resumo, o rito te passagem de “menina” para “mulher” é quando esta casa e tem filhos. Não é só um rito de passagem, mas é também visto como o alto grau da ascensão social feminina, e se você tem uma situação financeira mais privilegiada, a única mudança é a expectativa na situação financeira que terá o seu parceiro.
Trabalho, estudos, carreira… Tudo isso é visto pela sociedade como algo secundário na trajetória da mulher. Tanto que, quando uma mulher desvia da expectativa cega de estrutura familiar — como foi o meu caso, mas deixo minha jornada para uma crônica à parte — todos a sua volta ficam admirados, impressionados, e até mesmo incrédulos devido à toda uma estrutura social onipresente que os induz a acreditar e esperar da mulher apenas um único modo de vida.
Veja bem, quero que fique bem claro que não vejo problema algum em casar, ter filhos e dedicar sua vida à este destino, desde que você, mulher, se sinta pessoalmente realizada com essa escolha. O que condeno é quando seguir este caminho não é um desejo direto da mulher, mas sim uma expectativa imposta — silenciosamente ou não — como se outros caminhos não existissem ou não fossem possíveis porque “coitada, ela é tão incapaz”. E meninas que reconhecem essa limitação muito cedo tendem a acreditar nela, se adequando às circunstâncias que a cercam, ou pior, ao que esperam delas — seja lá o que esperam.
Em uma entrevista sobre esse documentário, as diretoras Sandra Werneck e Gisela Camara disseram que o objetivo era responder a pergunta “por que uma menina abre mão da adolescência para ter um filho?” e descobriram, enquanto filmavam, que não há uma única resposta, mas que ter um filho pode ser sinônimo de status, especialmente para meninas e mulheres periféricas.
De acordo com os relatos das adolescentes Evelyn, Luana, Edilene e Joice, ter um filho era sinal de ser adulta e respeitada. Todas queriam ser vistas dessa forma, e como algumas já tinham experiência de cuidar de irmãos menores, seria algo grandioso para elas ter o seu próprio filho e deixar de cuidar “do filho dos outros”. Outras queriam parar de ser vista como criança e afirmar sua entrada no universo da mulher, então nada melhor do que um filho para marcar essa passagem. Teve também aquelas que foram pegas de surpresa pela gravidez e decidiram abraçar esse caminho, muito embora todas elas tivessem consciência da necessidade dos métodos contraceptivos para evitar gravidez e doenças sexualmente transmissíveis.
É possível perceber nesse documentário a força que tem uma sociedade patriarcal e sexista na vida e nas escolhas das mulheres desde muito cedo. Todas elas sabiam o que estavam fazendo/escolhendo/vivendo, porém não viam o quanto a realidade periférica delas seria alterada com a chegada de uma criança, pois não viam para si um futuro muito diferente do que a vida que já tinham, exceto Joice, que desejava muito ser da Marinha e foi pega de surpresa com uma gravidez.
Indico esse documentário a todas as meninas e mulheres, pais/responsáveis/cuidadores de crianças e adolescentes e a todos os professores de ensino básico. Não é um documentário novo, mas essa realidade ainda persiste e não não pode haver transformação social se não olharmos para o que acontece com a nossa sociedade.